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Astrologia moderna ou astrologia tradicional, clássica, helenística?



Alan Leo e a Reinvenção do Cosmos


O que você pensa quando ouve “horóscopo”? Um aplicativo como Co-Star prometendo guiar seu dia ou um meme no Instagram explicando por que seu amigo é “tão Virgem”? Hoje, a astrologia é onipresente, mas nem sempre foi assim. Há pouco mais de um século, um homem chamado Alan Leo enfrentou tribunais ingleses por ousar ler o futuro nas estrelas. Sua história não é apenas sobre um julgamento — é sobre como a astrologia deixou de prever o destino para se tornar uma ferramenta de autoconhecimento. E, no caminho, perdeu parte de sua essência ou ganhou nova vida? Vamos por partes.

Por trás dos horóscopos de jornal e das leituras psicológicas, há uma história profunda — e até dramática. Alan Leo, o “pai invisível” da astrologia moderna, foi o responsável por tirar a astrologia do campo das previsões fatalistas e colocá-la no universo da psicologia e da espiritualidade. Mas essa mudança não veio por idealismo puro: foi forçada por um processo judicial em plena Londres do início do século XX. Para entender como chegamos aqui, precisamos voltar no tempo e destrinchar uma longa cadeia de eventos.


Breve História da Astrologia Inglesa

Durante séculos, a astrologia foi parte do tecido cultural da Inglaterra. Na Idade Média, astrólogos como John Dee, conselheiro de Elizabeth I, e Robert Fludd misturavam astrologia, alquimia e matemática, sendo figuras respeitadas nas cortes e universidades. A astrologia era um saber erudito, usado por médicos para diagnósticos, por nobres para casamentos e até por militares para planejar batalhas. Mesmo com o protestantismo consolidado após Henrique VIII romper com Roma em 1534, a astrologia permaneceu forte. Diferentemente do que se poderia esperar, não houve perseguição direta: ela era útil demais.

Durante as Guerras Civis Inglesas (1642–1651), astrólogos como William Lilly publicavam previsões políticas em panfletos, influenciando a opinião pública. Lilly, aliás, ficou famoso por prever o Grande Incêndio de Londres de 1666. Mas, com o avanço do racionalismo científico — representado por nomes como Robert Boyle e Isaac Newton — e do protestantismo puritano, a astrologia começou a ser vista como “crendice vulgar”. Já não era mais ciência; era superstição. Ainda assim, sobrevivia, especialmente entre as classes populares.

Enquanto isso, em outras partes do mundo, a astrologia florescia sem grandes interrupções. Na Índia, a astrologia védica guiava decisões de casamentos e políticas, e no mundo árabe, astrólogos como Albumasar influenciavam o Ocidente com tratados sofisticados. Na Inglaterra, porém, o cenário estava prestes a mudar.


Século XVIII – Iluminismo e Repressão Cultural

O Iluminismo trouxe uma nova visão de mundo, onde apenas o que podia ser medido e provado tinha valor. A astrologia, junto com a alquimia e outras práticas tradicionais, foi relegada ao mesmo patamar de charlatanismo. A elite protestante, influenciada pelo deísmo e pelo empirismo, via a astrologia como um resquício da ignorância medieval. Esse clima preparou o terreno para leis que reprimiam práticas esotéricas, culminando no Vagrancy Act de 1824.


O Vagrancy Act de 1824

Em 1824, o Reino Unido promulgou o Vagrancy Act, uma lei supostamente voltada para combater vadiagem, mendicância e práticas que “ameaçavam a ordem pública”. No mesmo balaio, entravam cartomantes, videntes, médiuns e astrólogos que ousassem prever o futuro. A lógica era clara: afirmar saber o que ia acontecer, mesmo sem enganar ninguém, era ilegal. Por trás disso, havia um forte viés cristão. Passagens bíblicas como Deuteronômio 18:10-12, que condenam a adivinhação, serviam de respaldo moral, embora práticas esotéricas como a maçonaria fossem toleradas entre as elites.


Mas a lei também tinha raízes econômicas. Após as guerras napoleônicas (1803–1815), a Inglaterra saiu vitoriosa, mas economicamente devastada. Milhares de soldados voltaram do front sem empregos, terras ou assistência. A Revolução Industrial intensificava a urbanização, a pobreza e o desemprego em massa. Nesse contexto, práticas como a astrologia, populares entre as classes baixas, eram vistas como “soluções desesperadas” para sobreviver. O Vagrancy Act tentou forçar as pessoas a abandonarem esses “subempregos” e buscar trabalho nas fábricas, mas ignorava a realidade: não havia empregos suficientes.


Curiosamente, o Vagrancy Act revela que a astrologia inglesa era, nessa época, uma prática popular, bem mais próxima das massas do que das elites. Ao contrário do que alguns astrólogos sugerem, a ideia de que a astrologia era exclusividade das elites é verdadeira apenas na Idade Média. Desde o período helenístico (séculos II a.C. a VI d.C.), ela já era acessível, com registros de mapas natais de pessoas comuns, incluindo escravizados por dívidas.


O Nascimento de Alan Leo

Alan Leo nasceu em 1860, numa Londres onde a astrologia estava meio escondida, mas viva. Influenciado pela Teosofia de Helena Blavatsky, que misturava esoterismo ocidental com filosofias orientais, ele via a astrologia como um mapa da alma, não apenas um oráculo do futuro. Leo publicou livros como The Art of Synthesis, fundou a revista Modern Astrology e popularizou a astrologia como uma ciência espiritual. Seus mapas natais por correspondência e palestras atraíam multidões, tornando-o uma figura central no renascimento astrológico do final do século XIX.

O Primeiro Processo – 1914

Em 1914, com a Primeira Guerra Mundial no horizonte, a Inglaterra vivia um clima de tensão. O governo, preocupado com práticas que pudessem desestabilizar a ordem, voltou os olhos para Leo. Ele foi processado por enviar previsões por escrito a um cliente, violando o Vagrancy Act. Sua defesa foi engenhosa: “Eu não prevejo o futuro. Eu descrevo tendências de caráter.” Absolvido, Leo abriu uma brecha para a astrologia psicológica, mas o Estado não desistiria tão fácil.

O Segundo Processo – 1917

Em 1917, em plena guerra, Leo caiu numa armadilha. Um agente da polícia, disfarçado, encomendou um mapa astral. Em sua análise, Leo escreveu algo como: “Há a possibilidade de uma perda familiar por morte.” A frase, embora genérica, bastou. Ele foi condenado sob o Vagrancy Act e multado. Curiosamente, não houve reclamação de cliente ou prova de erro na previsão — o problema era simplesmente ter falado do futuro. Nunca saberemos se o policial realmente perdeu um parente à época.

A Virada Histórica

O segundo processo forçou Leo a repensar a astrologia. Prever eventos, como faziam os astrólogos tradicionais com técnicas como astrologia horária ou revoluções solares, era arriscado. Ele então reformulou sua prática, focando em:

•  Potencialidades do mapa: traços de personalidade, talentos e desafios.

•  Desenvolvimento da alma: inspirado pela Teosofia, via o mapa como um guia espiritual.

•  Tendências gerais: evitando previsões específicas para escapar da lei.

Essa mudança marcou o nascimento da astrologia psicológica, que seria aprofundada por nomes como Dane Rudhyar, Carl Jung e Liz Greene no século XX. Enquanto a astrologia tradicional usava um ou dois planetas (como o regente do Ascendente) para descrever o temperamento, a moderna transformou o mapa inteiro em um espelho da psique, com cada planeta, casa e aspecto contribuindo para uma narrativa pessoal.


Astrologia Tradicional vs. Moderna: Um Exemplo Prático

Considere Marte em Áries na 7ª casa de um mapa natal. Na astrologia tradicional, Marte, regente de Áries, é analisado por sua dignidade, casa e aspectos. Na 7ª casa, pode indicar conflitos em parcerias ou um cônjuge de temperamento forte, com eventos previstos por técnicas como progressões. Na astrologia moderna, o mesmo posicionamento é visto como uma tendência psicológica: energia impulsiva em relacionamentos, busca por parceiros intensos ou projeção de conflitos internos. O foco não está em eventos, mas em como o indivíduo expressa essa energia.

Essa diferença reflete uma mudança de paradigma. A astrologia tradicional, praticada desde o período helenístico até o Renascimento, era uma arte preditiva, com ferramentas como astrologia horária (para responder perguntas específicas) e revoluções solares (para prever eventos anuais). A astrologia moderna, por outro lado, prioriza o autoconhecimento, influenciada por ideias psicológicas e pela espiritualidade teosófica.


O Legado de Alan Leo

Não há evidências de que a condenação de 1917 tenha causado diretamente a morte de Alan Leo, vítima de um AVC no mesmo ano. Ainda assim, é tentador imaginar que o estresse do processo tenha contribuído. Seu legado, porém, é inegável — e ambíguo. Leo salvou a astrologia da marginalização, mas a um custo: a arte milenar de prever eventos foi substituída por uma abordagem psicológica que, para alguns, diluiu sua complexidade técnica. Ele transformou a astrologia em algo acessível, mas também a limitou no imaginário coletivo.

Astrólogos tradicionais contemporâneos, como Olivia Barclay, John Frawley e Deborah Houlding (fundadora do site Skyscript), têm trabalhado para resgatar técnicas antigas, como a astrologia horária e a análise de dignidades planetárias. Eles argumentam que a astrologia é mais do que uma ferramenta de autoconhecimento: é uma ciência do destino, capaz de oferecer respostas concretas.

Enquanto isso, a astrologia moderna domina a cultura pop. De horóscopos simplistas em jornais a aplicativos como Co-Star, que traduzem mapas natais em conselhos diários, a visão de Leo está por trás de tudo. Mas a pergunta permanece: ao se reinventar, a astrologia ganhou acessibilidade ou perdeu sua essência?


Astrologia Tradicional vs. Moderna Hoje

Hoje, as duas abordagens coexistem, cada uma com seu público. A astrologia tradicional atrai quem busca precisão técnica e respostas práticas, como “Devo aceitar esse emprego?” ou “Quando devo me mudar?”. A moderna domina o mainstream, com sua ênfase no crescimento pessoal e na espiritualidade acessível. A tabela abaixo resume as diferenças:


Comparação entre Astrologia Tradicional e Astrologia Moderna

1.  Foco

•  Astrologia Tradicional: Previsão de eventos concretos

•  Astrologia Moderna: Autoconhecimento e psicologia

2.  Técnicas

•  Astrologia Tradicional: Horária, revoluções solares, dignidades planetárias

•  Astrologia Moderna: Análise psicológica, interpretação simbólica

3.  Objetivo

•  Astrologia Tradicional: Orientar decisões práticas

•  Astrologia Moderna: Promover crescimento pessoal

4.  Visão do Mapa

•  Astrologia Tradicional: Mapa do destino, com significadores específicos

•  Astrologia Moderna: Espelho da psique, com ênfase holística


Conclusão

Alan Leo não apenas salvou a astrologia de uma perseguição estatal, mas a reinventou para um mundo que exigia novas respostas. Sua virada para o autoconhecimento abriu portas, mas também deixou saudades da precisão preditiva da astrologia tradicional. Hoje, enquanto memes astrológicos e aplicativos democratizam os signos, astrólogos tradicionais reacendem o debate: seria a astrologia uma ciência do destino ou um espelho da alma? Talvez, como os astros, ela seja ambas as coisas — dependendo de quem a observa.


Notas Finais

•  Fontes: O texto se baseia em eventos históricos documentados, como os processos de Alan Leo e o Vagrancy Act. Para mais detalhes, recomendo A History of Western Astrology de Nicholas Campion e Christian Astrology de William Lilly.

•  Como astrólogo, vejo a tensão entre tradição e modernidade como uma oportunidade. A astrologia tradicional me ensinou a respeitar a precisão dos astros, enquanto a moderna me lembra que, no fundo, buscamos sentido — seja no destino ou em nós mesmos.


Para solicitar o mapa astral, previsões ou aula de astrologia, mande mensagem no (11) 96690 6266

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